segunda-feira, 7 de outubro de 2013

LEANDRO CHIARATTI AYRES - Nº USP: 7118866

Rio de Janeiro, Estádio Maracanã, final da Copa do Mundo de Futebol do ano de 2014.
Nas arquibancadas, os senhores Paul Ricoeur e François Furet encontram-se por uma incrível coincidência (ou não, depende de qual dos dois é questionado à respeito).

Ricoeur: Furet meu caro, mas que agradável surpresa. Jamais imaginaria que pudéssemos nos encontrar por aqui, veja só. Clima incrível não!? Esse calor, essa energia, realmente, incrível esse negócio de futebol. 

Furet: Evidentemente, são ventos muito mais favoráveis à prática esportiva do que aqueles ao que estamos acostumados no Velho Mundo. Mas estou aqui com outras intenções, colega. Encontrei uma oportunidade perfeita para testar uma nova forma de cruzamento de dados, ideal para o trabalho de nós historiadores, coletei diversos números sobre todas as partidas, e estou certo de que, ao final, o apito soará favorável à seleção canarinho. Os números não mentem, seus atacantes são mais eficientes, sua zaga é a melhor da competição, seu meio campo tem uma capacidade incrível de manter a posse de bola e armar jogadas, enfim, uma verdadeira barbada, pode apostar. Aliás, apostaremos.

Ricoeur: Pois bem, fechamos uma aposta, 100 reais, eu apoiarei a Celeste. Agora atenção ao jogo meu caro, pois perderemos jogadas incríveis, mais importantes até que a partida em si, enquanto discutimos, e isso é a única coisa que eu concordo ser possível de apreender através desse monte de números aí, sabemos que vai ser uma partida "daquelas".

Furet: Humpf, devo dizer que será aposta mais fácil da minha vida meu amigo, veja a habilidade de Neymar Jr avançando e cortando a zaga... PENALTI!!! FOI PENALTI JUIZ!!!! Lugano passou uma rasteira no jovem atacante, esse juiz deve ser cego. Como pode não ver tão claramente a falta. Acompanhou o lance, Paul!?

Ricoeur: Não somente acompanhei como concordo, mas veja que os números, regras e demais elementos não são nada, estamos à mercê desse chamado "árbitro FIFA" que claramente mostra despreparo para acompanhar uma partida dessa envergadura. Mas é o futebol François, tão humano e falho quanto os jogadores que o jogam. Tão humano e falho quanto seus números. Lembra-se do jogo dessas duas equipes há 64 anos atrás!? Era uma barbada tão grande quanto a de hoje, porém teve resultados imprevisíveis até então. Inclusive para os apostadores que como você, adoram números. Pois lhe digo, cada lance tem sua importância, e esse penalti não dado gerará fatos à partir dele.

Furet: O único fato é a diferença no tratamento dado às equipes por esse senhor que arbitra a partida, aviltante eu diria. E essa história de 
Maracanazzo é somente uma exceção que confirma a regra, como dizem. Raios não caem duas vezes no mesmo local, eu lhe digo. Mas acompanharei ao seu lado, somente para provar-lhe o que eu disse.

Ricoeur: Como se nosso encontro aqui já não fosse numericamente improvável, mas não me enervarei, tenho uma partida emocionante para acompanhar.


E o jogo segue, até que a
pós 90 minutos sem gols, 3 bolas brasileiras na trave na prorrogação, 1 penalti não dado contra os Uruguaios, e uma lesão na coxa de Fred, e a expulsão de Daniel Alves por uma falta infantil, Forlán, com fôlego sobre-humano, já no segundo tempo extra, arranca com a bola de trás do meio campo em um contra ataque fulminante, passa por 2 zagueiros, toca encobrindo Julio César e marca o único gol da partida, levando o Uruguai ao segundo Maracanazzo após o apito final. Festa celeste no estádio mais emblemático do mundo novamente.

Furet: Tire esse sorrisinho do rosto, meu caro. Sua vitória, assim como a dos uruguaios, foi fruto de um roubo, de uma injustiça. O Brasil esteve melhor que os adversários em todos os jogos, inclusive nesse. Fica feliz ao me ver R$100,00 mais pobre(na cotação atual do Euro, uma ninharia), roubado por um juiz de índole duvidosa, ao ver a seleção com o mais eficiente futebol 
ser derrotada por um gol marcado por pura sorte. Contra todas as expectativas?

Ricoeur: Fico feliz ao vê-lo perder uma aposta para seus próprios números. Eles o traíram, e não o Juiz, que foi apenas uma peça na narrativa da partida, cumpriu seu papel, sendo fator preponderante para a derrota brasileira mesmo não tento papel de protagonista nessa partida, e que inclusive, foi ignorado por seus dados por não ter a mesma relevância de um dos onze jogadores.


Furet: Não zombe, foi meramente uma coincidência, pois sigo dizendo que se houvessem outras 100 partidas, a seleção brasileira ganharia a maioria delas.

Ricoeur: E ainda assim, hoje, eles perderam.
Ambos seguem debatendo, e não percebem a aproximação de um senhor com uma grande barba e forte sotaque alemão que ouvia a conversa de longe e calmamente apóia as mãos nos ombros dos exaltados filósofos e diz com um belo sorriso:

Meus caros, parem de discutir sobre o jogo e tomemos logo umas cervejas com esses Reais apostados. Se estão assim por diferenças ideológicas, imaginem eu, que certa vez escrevi que a história se repete, uma vez como tragédia e outra como farsa bem antes dos brasileiros tomarem o primeiro chocolate dos uruguaios. Vamos logo embora antes que pensem que eu tenho algo com isso.

Um comentário:

  1. Bom texto, coerente e claro, utiliza a história serial como ponto de divergência dos autores.

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