segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Final de Copa em 2014

O dia estava perfeito para uma partida de futebol, pensou Ricoeur enquanto se espremia por entre a multidão. A animação da torcida que se reunia no estádio era tanta, que o ar vibrava com felicidade e expectativa. Por entre alguns jovens vestidos de verde e amarelo, Ricoeur viu seu amigo, Furet. Chamou-o, e, juntos, se dirigiram para seus lugares.

— Ufa! – desabafou Furet quando se sentaram. – Já não tenho mais idade para vir ao estádio! Deveríamos ter ficado em casa e acompanhado o jogo pela TV.

Ricoeur riu do amigo.

— E perder este momento!? Oras! Eu quero estar bem presente em uma partida histórica como esta!

— Nós iríamos acompanhar a partida do mesmo jeito. Talvez até melhor, já que não teríamos essa garotada fazendo bagunça à nossa volta.

— Deixe de ser ranzinza, Furet! Sei que não há nada mais natural para um historiador que acompanhar um fato histórico à distância, mas, dada a oportunidade, por que não vive-lo? Acredito que assim será muito mais fácil de apreender este momento para poder estrutura-lo em nossos estudos depois. – disse 
Ricoeur com um sorrisinho debochado.

Furet olhou-o de canto de olho.

— Continue me provocando... Eu pensei que você tivesse me chamado para ver um jogo, não discutir teorias. Para isso, seria mais fácil irmos tomar um cafézinho. Seria menos... barulhento e movimento que aqui.

— Quem falou em discutir teorias, Furet! – disse Ricoeur entre altas risadas – Você tem que aprender a relaxar e aproveitar o momento! Se você não viver a Vida, como irá ensinar os outros a viver com seus estudos sobre a História?

Suspirando, Furet resolveu deixar as provocações de lado. O amigo tinha o costume de dar essas alfinetadas, de modo que ele já estava acostumado. Além do mais, pensou, haverá troco. Relaxando um pouco, Furet deu uma olhada em seu redor. Viu o campo, as muitas pessoas que, aos poucos, iam se acomodando em seus lugares, as cores verde-amarelo do Brasil contrastando com o azul-e-branco do Uruguai.

— Olha, depois que você se acomoda em seu lugar, o estádio fica bem agradável, até. – comentou – É impossível não se contagiar com essa animação toda! Talvez tenha sido uma excelente idéia ter vindo ver o jogo ao vivo, afinal.

Ricoeur sorriu.

— Eu sabia que você ia gostar! Está ansioso pelo começo da partida?

— Quero é saber o resultado desse jogo. Considerando que o Brasil perdeu para o Uruguai neste mesmo estádio em uma final de Copa a cerca de 60 anos, acredito que os dois times estejam bastante tensos. Os brasileiros não vão querer perder novamente, mas os uruguaios sabem que outra vitória como aquela seria uma grande humilhação para os rivais e um enorme estímulo para sua própria seleção.

— Bem, sim. A derrota do Brasil em 1950 ainda é viva na memória dos brasileiros; faz parte da história de seu futebol. E você tem razão quanto aos uruguaios: eles vão querer repetir a vitória. Mas, veja bem, aquela final foi um estímulo para os brasileiros, também. Foi ela quem produziu o Pelé, por exemplo, que não queria que aquela humilhação se repetisse.

— Ah!, sim. Bem, minha opinião é que o Brasil irá vencer hoje. A seleção brasileira tem maior número de vitórias sobre os uruguaios que o contrário. Além do mais, o desempenho brasileiro nos últimos tempos tem sido melhor que o do Uruguai.

Ricoeur se mexeu desconfortavelmente na cadeira.

— Tudo bem? – perguntou Furet, que percebera o movimento do amigo.

— Lá vem você, novamente. Sempre reduzindo a história a números e estatísticas. – Ricoeur parecia um pouco irritado. – Você parece ignorar as circunstâncias que envolvem essa partida, meu caro. Os jogadores do Brasil têm sido grande destaque no futebol mundial, e eles têm a oportunidade de um acerto de contas aqui. No entanto, o jogo é imprevisível, pois os uruguaios também virão com tudo; eles não poderão simplesmente aceitar a vingança da seleção rival.

Não podendo aguentar mais, Furet soltou uma sonora gargalhada.

— Acredito que quem obteve vingança aqui fui eu, seu fanfarrão! Falei para não me provocar! Eu sempre me surpreendo em como você se irrita fácil. “Você precisa aprender a relaxar, Furet”. “Ninguém falou em discutir teorias, Furet”. Há!

Por um momento, Ricoeur pareceu perdido. Então, a compreensão iluminou seu rosto – havia caído na provocação do amigo – e ele ficou desconcertado, o que fez com que Furet risse ainda mais. Por fim, riu também.

— Está bem, admito derrota.

— Isso vai ficar para sempre em nossas memórias, – disse Furet com voz debochada – passando a fazer parte de nossa história. Lembre-se de estruturar bem essa experiência para poder narra-la aos seus netos, Ricoeur.

— Não é necessário lembrar de um ponto factual, é? Basta contar a eles que nosso placar está em... Quantas vezes te tirei do sério, mesmo? Você é quem conta essas coisas.


— Ora, fique quieto. Vamos ver se o Brasil vai conseguir se vingar do Uruguai também, sim?


Henrique Costa
7700192 – Noturno

2 comentários:

  1. Muito bom o seu texto. A narrativa é clara e agradável, nada rebuscada, com um ou outro pequeno erro de português que em nada afeta a compreensão. A costura do enredo com as teorias de Ricoeur e Furet é equilbrado, mas o segundo me parece mais marcado. Novamente, muito bom.

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  2. Diálogo criativo, mas poderia ter explorado mais os conceitos e o confronto intelectual entre os autores, sobretudo a questão da narrativa.

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